O nascimento de um Bombeiro
O fogo nasce do calor, do fumo e da luz, alimentando-se das coisas que lhe deram vida. Leva o que quer, sem remorsos, sem piedade. Uma beleza terrícel que muda tudo num instante e, assim que nos toca, nunca mais somos os mesmos. Esperei muito tempo para entrar num fogo, ver as chamas acenarem por detrás de uma porta. Tocar na porta e sentir a respiração da besta atrás dela e abri-la na mesma e deixá-la sair. Conheci o fogo pela primeira vez numa fria noite de Novembro há 15 anos, quando acordei com dores de barriga e vi as luzes a rodopiar na janela do restaurante da minha família do outro lado da estrada. Eram tão bonitas. Nunca pensei que fosse fácil. Eu sabia-o mesmo naquela noite, quando vi pela primeira vez os bombeiros a combaterem no Sirico's e a perderem. O nosso restaurante ardeu por completo, mas foi tão bonito. Senti quase uma dor dentro de mim. Chamas por todo o lado, ás vezes, violentas, ás vezes, trocistas, mas sempre a rodopiar. E eu perguntava-me como seria dentro do fogo, onde os bombeiros entravam. E depois vi o meu pai a chorar. E a minha mãe também. E senti-me dividida ao meio, pois algo que me preenchia com tanta admiração podia magoar tanto as pessoas que adorava. E isso tornou-se na história da minha vida. Naquela noite, enquanto andava no meio dos bombeiros, enquanto aqueles homens corajosos tiravam as chávenas do tabuleiro, não havia outro sítio onde eu preferisse estar. E agora, não há outro sítio onde eu preferia estar. Mas o fogo é sempre seguido de escuridão, e, de manhã, o Sirico's era uma imagem escura e triste da sua outrora existência. Eu sabia que, apesar de toda a sua beleza, o fogo é a cor da fúria. O fogo é a cor do ódio. Se eu, na altura, soubesse o que sei hoje. Alguns fogos continuam a arder, e a arder. E aprenderia pessoalmente toda a dor que ele podia causar, o sofrimento e o terror, e de que maneira não podia deixar que isso me parasse. Esta era a minha batalha e eu ia vencê-la.
in Blue Smoke
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