sexta-feira, novembro 07, 2008

Repúblicas e Solares de Coimbra

Este post surgiu depois de ter recebido um mail do meu pai com alguns desenhos de algumas das repúblicas mais antigas de Coimbra. A verdade é que sabendo que elas existiam, não sabia que estavam activas, ou que eram em tão grande número. Desconhecia por completo. Provavelmente já passei à frente delas sem saber. Tenho a certeza que sei onde fica a República dos Fantasmas porque costumava passar por lá de autocarro, mas a minha cultura de repúblicas fica por aí. Mas como gosto de pesquisar por natureza, fui ver o que encontrava sobre as Repúblicas de Coimbra.

Primeiro, há que fazer algumas disitinções.
Casa comunitária: qualquer pessoa pode formar uma casa comunitária. Esta é, geralmente, constituída por um grupo de amigos, que tem uma vida ao estilo da república, mas que não é reconhecido pelo Conselho das Repúblicas. As casas comunitárias podem propor-se ao Conselho das Repúblicas que lhes dará ou não o título de Solar.

Solar: É uma república recente, não tem voto no Conselho de Repúblicas, embora tenha direito à opinião e a frequentar os Conselhos. Um solar pode sempre tornar-se numa República, caso tenha para isso aprovação.

República: Tem um estatuto priveligiado nos Conselhos de República, tendo direito de voto e opinião. Há algumas repúblicas que mantêm actualmente o nome de solar, embora não o sejam.

As repúblicas e solares são organizações sem fins lucrativos que se destinam a albergar estudantes do ensino superior e gerida por estes. Em Portugal, são abrigadas por lei. A primeira versão desta lei dizia apenas respeito a repúblicas de estudantes de Coimbra e dizia que, desde que com a devida aprovação do Reitor da Universidade, "as repúblicas e os solares de estudantes de Coimbra constituídos de harmonia com a praxe académica consideram-se associações sem personalidade jurídica" (Lei n.º2/82 de 15 de Janeiro, Diário da República I SÉRIE – Nº12 – 15-1-1982), sendo esta lei depois alargada em 1989 e, assim, criada a primeira república em Lisboa.

Ao longo dos tempos, foi-se estabelecendo um código de comportamento informal, mais tarde oficializado no Código da Praxe. Hoje, a sua existência está prevista na Secção IV, Título III, art.ºs 197º-200º, daquele código.

Existem vários tipos de repúblicas que devem ser especificados aquando da sua criação. A gestão (como dito em cima) cabe aos residentes permanentes (Repúblicos), que têm todos responsabilidades por igual. Uma das suas mais antigas tradições relaciona-se com o lema "Um ano vale por cem", e, por isso, todos os anos, cada república celebra o seu centenário "à porta aberta".

Estas organizações seculares são reponsáveis em grande parte, pelo ambiente sui generis da cidade dos estudantes. Berço do romantismo boémio, libertam em torno de si em sentimento mitológico, que lhes confere uma forte identidade académica, assente numa sólida estrutura social e simbólica.

As suas origens remontam ao séc. XIV. Por esta altura já Coimbra era um importante centro de estudos onde acorria, cada vez mais, um número crescente de pessoas para aí receberem os seus ensinamentos. Foi este aumento repentino da população escolar, que fez com que a cidade se debatesse rapidamente com carências a nível habitacional. Por forma a ultrapassar este problema, foi criado em 1309, por D. Dinis, o diploma régio que visava a construção de casas na zona de Almedina e que deveriam ser habitadas pelos estudantes, mediante o pagamento de um aluguer, cujo montante seria fixado por uma comissão constituída por estudantes e por "homens bons" da cidade, expressamente nomeada pelo Rei. Foi, pois, a partir de um tipo de alojamento comum, permitindo aos estudantes minimizar os encargos económicos, que surgiram, por evolução, as Repúblicas dos nossos dias.

Nas Repúblicas de Coimbra, diz-se, respira-se um ambiente único em originalidade e irreverência. Vivem debaixo do mesmo tecto pessoas com divergências ideológicas por vezes bastante acentuadas, o que origina acesos debates. A ceia proporciona momentos de rara eloquência onde temas tão diversos como a política, a religião, os estudos ou as maleitas de amos servem para acalorar as frias noites coimbrãs. Ou pelo menos assim acontecia, em tempos idos. No entanto, um ponto comum une estes jovens, que tragam a vida com sofreguidão, o repeito mútuo pelos valores dos seus companheiros. Pontfica, acima de tudo, um ambiente de franca camaradagem.

Em 11 de Dezembro de 1948 cria-se o Conselho das Repúblicas, tendo como principal objectivo aumentar o número destas e garantir a sua subsistência por tempo indefinido.

A imagem das repúblicas esteve constantemente aliada à irreverência e à contestação do poder, sempre que isso significasse a defesa dos interesses da Academia. Assim foi, na década de 60, contestando o regime salazarista. A Crise Académica de 69 constituiu um retrato fiel da coragem e do espírito reivindicativo aí existentes; uma lista apoiada pelo Conselho das Repúblicas venceu, por esmagadora maioria, as eleições para a AAC. No início da década de 70, com a queda do salazarismo, importantes movimentos sociais intervieram na vida académica.

Ontem, como hoje, impõem-se universalmente valores que unem o passado ao presente: a vida em comunidade, a soberania e a democraticidade.

Ok, e depois de tanta introdução, aqui ficam as gravuras que provocaram toda esta pesquisa.

Real República Trunfé-Kopos
Fundada em 1960, sita na Rua Pires de Campos, nº18.

Real República Spreit-Ó-Furo
Fundada em 1951, sita na Ladeira do Seminário, Vila Bento, nº1.

República (ou Solar) Rosa do Luxemburgo
Fundada em 1972, sita na Rua Correia Teles, nº2, 1º.

Solar dos Kapangas
Fundado em 1958, sita na Rua da Mãozinha, nº20.

Solar dos 44
Fundado em 1983, sita na Rua das Matemáticas, nº44.

Real República Rás-Teparta
Fundada em 1943 na antiga Rua dos Estudos, hoje sita na Rua da Matemática, nº6.

Real República Rapó-Tacho
Fundada em 1956, hoje sita no Bairro Sousa Pinto, nº13.

Real República PYN-GOINS
Fundada em 1955, sita na Rua Dr. Henriques Seco, nº44.

Real República do Prà-Kys-Tão
Fundada em 1951, sita na Casa da Nau, Rua das Esteirinhas, nº2.

Real República Palácio da Loucura
Fundada em 1947, sita na Rua Antero de Quental, nº 21.

República Kimbo dos Sobas
Fundada em 1963, sita na Rua Antero de Quental, nº 217.

Paços da República dos Kágados
Fundada em 1933 na Rua do Correio, hoje sita na Rua Joaquim António de Aguiar, nº98.

República dos Inkas
Fundada em 1954, sita na Rua da Matemática, nº32.

República dos Galifões
Fundada em 1947, sita na Couraça dos Apóstolos, nº 124.

República dos Fantasmas
Fundada em 1969, sita no Bairro Sousa Pinto, nº15.

Real República Corsário das Ilhas
Fundada em 1958, sita na Couraça dos Apóstolos, nº 112.

Real República Bota-A-Baixo
Fundada em 1949 na Rua do Borralho, hoje sita na Rua S. Salvador, nº 6.

Real República Boa-Bay-Ela
Fundada em 1956, sita na Rua João Pinto Ribeiro, nº 17.

Real República Ay-Ò-Linda
Fundada em 1951, sita no Bairro Sousa Pinto, nº33.

Outras repúblicas e solares:
República da Praça
Fundada em 1989, sita na Praça da República, nº 38, 2º.

República do Kuarenta
Sita na Rua da Matemática, nº 40.

República Farol das Ilhas
Fundada em 1962, sita na Rua Teixeira Carvalho, nº 25.

Solar Residência dos Estudantes Açoreanos
Fundado em 1962, sita na Rua António de Vasconcelos, nº 18B.

República 5 de Outubro
Fundada em 1967 na Rua de Aveiro, hoje sita na Av. Bissaya Barreto, Rua E, nº 22, 4º.

Real República Baco
Fundada em 1933 na Rua dos Militares, hoje sita na Rua do Loureiro.

República Ninho dos Matulões
Fundada em 1950 no Bairro Sousa Pinto, hoje sita na Av. Bissaya Barreto, nº29, 4º.

Solar Marias do Loureiro
Fundada em 1993, sita na Rua do Loureiro, nº 61, 3º.

Fontes: Wikipedia, Das Repúblicas..., Outros.

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4 comments:

Anonymous matheus said...

Só aqui no Bairro somos quatro repúblicas. ;)

Gostei de ver. Achei que nossa casa não tivesse dessas ilustrações giras.

2:06 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Muito Bom este texto. Uma boa pesquisa e um bom retrato do que são as repúblicas. Tenho a referir que o Kimbo dos Sobas infelizmente já não existe. Bom trabalho :)

3:07 da manhã  
Blogger Carlos Nery said...

Fui um dos fundadores da República Trunfé-Kopos, ainda no Bairro Silva-Rosas. Foi um tempo de grande efervescência em Coimbra. Começara a guerra de África, o Henrique Calvão assaltou o Santa Maria, era grande a actividade cultural. Eu pertencia ao CITAC, entrei em diversos espectáculos, nomeadamente em "O Tartufo" de Moliére, encenado pelo Luís de Lima. Realizou-se, por essa altura, o Dia do Estudante com os costumados confrontos com a polícia de choque e com malta presa. Tudo isso era intensamente vivido na República. Não, o Alberto João nunca viveu (no meu tempo) no Trunfé-Kopos. Quem por lá passava e comia connosco era o Adriano Correia de Oliveira, ainda sem a fama que em breve alcançaria. Vivia no Porto e vinha a Coimbra fazer não sei que cadeiras. Gostava de cantar para nós e, por vezes, ia para a rua improvisar uma espécie de serenatas para umas moças que viviam numa casa à esquina do Bairro, à luz do dia, sem precisar sequer da capa e batina. Se alguém estiver interessado em saber coisas desse tempo o meu contacto é carlosnery@yahoo.com.

8:44 da tarde  
Blogger André Miguel said...

Podias ter referido o nome da primeira República de Lisboa, "A Desordem dos Engenheiros".

7:15 da tarde  

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